sexta-feira, 29/03/2024
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Assédio de jornalistas a mulheres em redes sociais é descoberto e exposto pelo fact-checking

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Imagem ilustrativa/divulgação

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          Um dos principais problemas das redes sociais é a facilidade com a qual a desinformação e o discurso de ódio são catalisados pelos seus algoritmos, perfis falsos e fábricas de cliques. Essa mistura perigosa tem sido usada para manipular sociedades e destruir reputações. O jornalismo e a educação midiática são, entre outras, duas poderosas frentes de contra-ataque a conteúdos tóxicos como esses.

          Mas até profissionais de comunicação, conhecedores de como se propaga a desinformação na rede social, protagonizaram, a partir da percepção de poder em relação a outros, a multiplicação no Facebook e no Twitter do que, em tese, devem combater diariamente. A atividade, entretanto, foi descoberta pela cada vez mais importante prática jornalística da verificação de fatos.

          No fim da semana passada, o escândalo do grupo fechado no Facebook chamado Liga do LOL (em inglês, Laughing Out Loud, algo como rindo alto) abalou o meio jornalístico da França. O caso veio à tona a partir do trabalho do site de fact-checking do jornal francês de esquerda Libération (o Libération CheckNews). Uma conversa no Twitter entre os jornalistas Thomas Messias, da revista Slate, e Alexandre Hervaud, profissional do mesmo Libération e integrante da Liga do LOL, motivou a verificação, que levou à descoberta e à exposição da “gangue digital” composta por cerca de 30 pessoas, em sua maioria homens brancos, jornalistas, blogueiros ou publicitários.

Linchamento online

        O grupo, criado pelo jornalista Vincent Glag, que também escreve para o Libération, promoveu entre 2000 e 2013 agressões verbais contra mulheres e minorias que acabavam impulsionadas dentro do modelo de negócios do Facebook. Em alguns casos, saíram do virtual para o real. A videomaker Florence Porcel, por exemplo, contou que foi e vítima de um “linchamento online”. Certa vez, disse, um integrante da Liga do LOL, David Doucet, editor-chefe de web da revista Les Inrockuptibles, telefonou para ela fingindo oferecer um emprego, enquanto gravava a conversa. “Quando a gravação se tornou pública, chorei de vergonha, humilhação e medo por três dias. Eu não queria sair”, disse Porcel, que também apareceu em uma fotomontagem pornográfica.

       Depois que o caso foi revelado, diversas outras mulheres agredidas decidiram expor as situações as quais foram submetidas e provocar um debate sobre abuso de poder. “Sou talvez uma das muitas vítimas da Liga do LOL que começam a falar”, escreveu nesta terça-feira (12) no portal da Slate a jornalista Léa Lejeune, que afirma ter sido agredida durante anos. “Com frequência eram piadas em 140 caracteres, comentários ofensivos, outros sobre minha sexualidade ou comentários publicados no blog feminista que eu tinha então”, contou Lejeune, jornalista do semanário francês de economia Challenges.

         “Durante diversos anos no Twitter, eu e outras amigas feministas fomos alvo desses caras parisienses que tiravam onda da nossa cara”, disse Daria Marx ao Libération. “Eu era gorda e, por isso, não tinha o direito de falar. Um dia, um dos membros dessa Liga pegou uma imagem pornográfica de uma menina gorda e loira, que poderia vagamente se parecer comigo, e a compartilhou dizendo ter encontrado minha ‘sextape'”, afirmou.

Sexismo e poder

       “Eles eram absolutamente infames no Twitter”, salientou Nora Bouazzouni, jornalista do site FranceInfo. “Fui atacada com insultos, montagens fotográficas, GIFs pornográficos com minha cara e e-mails anônimos”, disse. “Um desses personagens, que fazia parte do grupo, com quem tive uma relação, me fez acreditar que tinha Aids para me assustar. São loucos”, desabafou a repórter Capucine Piot. “Cheguei a um ponto em que me odiava. Tive ideias obscuras. Lendo tantas coisas horríveis sobre mim nas redes sociais, pensava que não valia nada”.

     Mélanie Wanga, cofundadora do podcast Le Tchip – que aborda “a experiência negra”, segundo o site do projeto – também acusou A Liga do LOL de atacar, além das feministas, as pessoas LGBT e militantes antirracistas. “Imaginem ser uma jornalista preta, falar de ‘blackface’, de apartheid e ter que ver coisas como essas 20 vezes por dia pelos ‘colegas’ durante vários dias”, disse Mélanie no Twitter, onde ela mostra imagens de mensagens dos membros do grupo menosprezando ou zombando de seu trabalho.

As denúncias sobre a atuação da Liga do Lol esquentaram o debate sobre o sexismo nos meios de comunicação. “Os integrantes da Liga do LOL construíram uma imagem de ‘caras legais’, pessoas engraçadas e brilhantes, graças a esse espírito masculino coletivo que agora detêm a posição de poder”, disse Aude Lorriaux, porta-voz do coletivo de mulheres jornalistas Prenons la une.

Em busca de punição

Após a revelação do caso, o fundador da Liga do LOL, o jornalista Glad, disse que objetivo do grupo não era assediar mulheres, mas apenas promover diversão. “Mas nossa forma de nos divertirmos rapidamente se tornou muito problemática e não percebemos”, disse o profissional no Twitter. Outro integrante, o podcaster Henry Michel, disse que a Liga do LOL tinha a intenção de produzir piadas que não podiam ser feitas em público. “Era divertido, besta, tinha esse lado de um observatório dos personagens do Twitter. Compartilhávamos links, fotos, fazíamos piada das pessoas”, contou.

Outros membros do grupo, como Alexandre Hervaud, também do Libération (atualmente suspenso) disseram que não fazem as mesmas piadas e que “mudaram”. Em defesa das vítimas, a jornalista Iris KV retrucou que “mudar é bom”, mas exigiu um pedido de desculpas oficial da parte dos agressores. Ela publicou uma mensagem a “todos os membros da Liga do LOL, que agrediam feministas, indivíduos com problemas mentais, etc. (…) Vocês se esqueceram, mas as pessoas que sofreram têm uma memória melhor”.

As acusações contra os membros da Liga do LOL, fatos ocorridos antes de 2013, já prescreveram, levando em conta o prazo para crimes de cyberbullying, que é de seis anos na França. Marlène Schiappa, secretária de Estado encarregada da Igualdade de gênero e da Luta contra as discriminações, disse que tentaria propor um prolongamento desse período. A punição para esse tipo de delito é de € 30 mil e pode chegar a € 45 mil e três anos de prisão se a vítima for menor de idade ou vulnerável.

A maioria dos jornalistas participantes da Liga do LOL foi afastada de suas funções e está sob investigação ou demitida.

ANJ

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