quinta-feira, 28/03/2024
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Saudade ou tristeza?

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Fotos com imagens históricas de Cuiabá,MT

Jairo Pitolé Sant’Ana (*)

                            Será possível sentir saudades de uma vida que não se viveu? Parece que sim. Comigo acontece sempre quando imagino a Cuiabá da década de 1960, cortada por inúmeros córregos e rios, como uma Veneza (perdão pela hipérbole) do Cerrado; quando o peixe era farto e o calor abrandado pela umidade emanada de seus leitos e pelo verde dos quintais.

                            (E olha que não posso reclamar da minha infância de interiorano, das “peladas” jogadas em campinhos improvisados às margens de –também – córregos e rios, onde se refrescava durante o intervalo entre uma partida e outra).

                       Cuiabá era, ainda naquela década, uma cidade com 60 mil habitantes, que foram dobrando, como em uma progressão aritmética, nas décadas seguintes – 103 mil habitantes, em 1970; 217 mil, em 1980; e 401 mil, 1990. Hoje, quase 1 milhão de habitantes (incluindo Várzea Grandevivem em sua região metropolitana.

                           À medida que a população foi crescendo e se gentrificando (quando os mais pobres são empurrados para áreas mais distantes e menos nobres, o que, com raras exceções, não é “privilégio” nem de Cuiabá, nem de Mato Grosso, nem do Brasil – onde há especulação imobiliária, com certeza há gentrificação), os córregos foram sendo os depósitos naturais de lixo e de lançamento do esgoto doméstico.

                        Deu no que deu. Areão, Barbado, Baú, Caixão, Canjica, Engole Cobra, Gambá, Gumitá, Mãe Bonifácia, Mané Pinto, Moinho, Prainha, Quarta-feira, Ribeirão do Lipa, São Gonçalo, Três Barra e 8 de Abril e outros sete, cujos nomes, confesso, não consegui levantar, quase todos, só têm nome de córrego. É esgoto puro. Dá até dó de ver.

                   E parece que entregaram pra Deus. Uma pesquisa, feita ainda década passada por geólogos da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso) a pedido da própria Prefeitura de Cuiabá, chegou a uma triste conclusão.

                     “Os 24 córregos da Capital, que deságuam nos rios Coxipó e Cuiabá, estão na eminência de virar simplesmente esgotos. Em 80% deles não há mais vida. A água secou, a mata ciliar desapareceu e muitos foram aterrados para garantir espaço para novas construções”.

                Imagens por satélites e inspeções constataram que em 208,4 mil km de extensão destes 24 córregos, 172,3 mil km já estavam com suas águas contaminadas por esgoto e lixo, causando a extinção de nascentes por erosão, aterramento e escavações. Foram os casos do Canjica, Gambá, Quarta-feira e Gumitá.

                     Nada foi feito. Logo em seguida à divulgação da pesquisa em 2009, Cuiabá foi anunciada como sub-sede da Copa do Mundo de Futebol e a febre das construções chegou ao seu grau máximo. Mesmo com crise, a febre se mantém, embora em menor intensidade.

             Nada foi feito e, pelo andar da carruagem, nada será feito – espero estar totalmente errado. É assim aqui, é assim em São Paulo, é assim no Rio de Janeiro … é assim no Brasil inteiro e em boa parte do mundo.

                Mas a continuar como está, a tendência é piorar, mais e mais, enquanto a herança para as gerações futuras será cada vez mais degradante. O leite está derramando e ninguém percebe ou finge que não percebe. O choro, se as lágrimas também não secarem antes, será inevitável. 

(*) Jornalista em  Mato Grosso - coxipoassessoria@gmail.com

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