A importância das denúncias para retirar da invisibilidade o trabalho infantil doméstico é abordada em campanha em alusão ao Dia das Crianças
MPT/MT
“Não existe final feliz com o trabalho infantil doméstico”. Esse é o tema da campanha de 12 de outubro – Dia das Crianças – realizada em conjunto por Ministério Público do Trabalho (MPT), Justiça do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e Organização Internacional do Trabalho (OIT), com apoio do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), para enfatizar a importância de se combater o trabalho infantil doméstico, considerado uma das piores formas de trabalho infantil e que, por ser extremamente invisibilizado e naturalizado, é de difícil fiscalização.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (2019), 84 mil crianças e adolescentes são vítimas do trabalho infantil doméstico no Brasil, realizado, em sua maioria, por meninas (85%), negras (70%) e adolescentes de 14 a 17 anos (94% do total), em atividades voltadas aos cuidados de crianças (48,6%), executando serviços domésticos (40,3%) e em cuidados pessoais em domicílio (5,3%), de acordo com pesquisa do FNPETI de 2019.
A campanha, iniciada hoje (12) nas redes sociais das instituições, conta a história de Maria, uma menina pobre que saiu do interior do país em busca de melhores condições de vida e acabou indo trabalhar na casa de uma família em outra cidade.
A história descortina a realidade por trás das promessas de melhoria de vida e do falso discurso de pertencimento à família empregadora. A história de Maria, infelizmente ainda comum a tantas meninas brasileiras, escancara a realidade do trabalho infantil doméstico: longas jornadas de trabalho; exposição a abusos físicos, psíquicos e até mesmo sexuais; condições análogas à de escravo; afastamento da família e da convivência comunitária; e violação aos direitos à educação e ao lazer.
A campanha pretende disseminar a informação de que o trabalho infantil doméstico é uma grave violação de direitos, que reproduz o ciclo de pobreza e rouba a infância plena e a perspectiva de futuro.
OUÇA A HISTÓRIA DE MARIA
A coordenadora nacional de Combate ao Trabalho Infantil e de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes (Coordinfância) do Ministério Público do Trabalho, Luísa Carvalho Rodrigues, afirma que “A campanha de conscientização lançada, com o mote ‘trabalho infantil doméstico não tem final feliz’, é uma importante iniciativa conjunta de vários órgãos que compõem o Sistema de Garantia de Direitos das Crianças e Adolescentes, no intuito de trazer visibilidade à essa grave violação de direitos e erradicar o trabalho infantil. É um chamado à sociedade para ajudar na transformação dessa triste realidade.”
Segundo a vice-coordenadora nacional da Coordinfância, Cláudia de Mendonça Braga Soares “De fato, um dos grandes desafios do combate ao trabalho infantil doméstico é retirá-lo da invisibilidade dos lares, onde essa violação a direitos é silenciosamente praticada, e trazê-lo à superfície, aos números oficiais, possibilitando proteção social a milhares de crianças e adolescentes, especialmente a tantas Marias desse Brasil, meninas negras, inseridas em famílias de baixa renda, a ter uma infância digna. Trazer o tema à discussão no Dia das Crianças é oportunizar a reflexão da sociedade de que existem diversas infâncias, vivenciadas de formas diferentes, a merecer proteção integral.”
O ministro do Tribunal Superior do Trabalho Evandro Valadão, coordenador nacional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, reforça a necessidade e união de instituições e sociedade para combater uma das formas de trabalho infantis mais comuns no Brasil. “O trabalho infantil doméstico é cruel em todas as suas nuances, pois viola direitos básicos, especialmente de meninas negras, além de jogar sob a infância e a adolescência responsabilidades que não as pertence”, disse. “São sonhos que vão morrendo sob uma desfaçatez gerada pela desigualdade histórica e permanente. Temos um longo caminho pela frente e a Justiça do Trabalho tem atuado e vai continuar atuando para erradicar essa tragédia social em nosso país”, completou.
A pobreza persistente, a vulnerabilidade socioeconômica das famílias e a desigualdade social, potencializadas pela ausência de políticas públicas impactam diretamente nos casos de trabalho infantil doméstico.
Para se combater essa grave violação a direitos é necessária, para além da garantia da educação de qualidade e em tempo integral, a formatação de políticas públicas intersetoriais de proteção social e geração de renda, políticas de desenvolvimento econômico, a ampliação de programas de estímulo e incentivo à aprendizagem profissional, além da efetivação do direito ao não trabalho crianças e adolescentes.
A coordenadora do Programa de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da OIT, Maria Cláudia Falcão, destaca que erradicar o trabalho infantil, incluindo o trabalho infantil doméstico, é uma meta assumida globalmente e de responsabilidade compartilhada no âmbito da Agenda 2030. “As meninas, meninos e adolescentes que realizam atividades domésticas são “trabalhadores invisíveis”, pois seu trabalho é realizado no interior de casas que não são as suas, sem nenhum sistema de controle e longe de suas famílias. Esta população é provavelmente a mais vulnerável e explorada, bem como a mais difícil de proteger.” disse ela.
“Por isso, precisamos aprimorar as políticas públicas para conseguir identificar essas vítimas, retirá-las desse tipo de trabalho e garantir proteção social para que possam retornar à sociedade, ter seus direitos restituídos e não sejam na idade adulta, trabalhadores e trabalhadoras vulneráveis ao aliciamento para o trabalho escravo.”, acrescentou.
Para o Coordenador Nacional de Fiscalização do Trabalho Infantil do Ministério do Trabalho e Emprego, o auditor fiscal do Trabalho Roberto Padilha Guimarães: “O trabalho infantil doméstico, uma das formas mais conhecidas de trabalho infantil, trata-se de uma violação aos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, com prejuízos ao seu desenvolvimento físico, psíquico, cognitivo e moral, bem como a sua frequência à escola. Além disso, crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil doméstico que acabam expostas a longas jornadas de trabalho e a diversos riscos, entre os quais: esforços físicos intensos; isolamento; abuso físico, psicológico e sexual; trabalho noturno; exposição ao fogo; movimentos repetitivos; tracionamento da coluna vertebral; contato com perfurocortantes; manuseio de produtos químicos, entre outros. Estima-se que mais de 83.000 crianças e adolescentes estejam submetidos a esta que é considerada uma das piores formas de trabalho infantil! Precisamos visibilizar esta realidade por meio de ações de informação, mobilização e sensibilização, e estimular que estes abusos sejam denunciados”.
Segundo a secretária-executiva do FNPETI, Katerina Volcov, campanhas de sensibilização sobre temas invisibilizados à população como é o caso do trabalho infantil doméstico são necessárias a fim de possibilitar a reflexão crítica de quem ainda faz uso de serviços de mão de obra infanto-juvenil e de quem ainda considera digno e justo que crianças trabalhem em suas próprias casas ou na de terceiros. “É praticamente um costume dizer que as trabalhadoras infantis domésticas trabalham em “casas de família”. Ora, nós não podemos nos esquecer que essa criança ou essa adolescente tem também sua família. Na verdade, quando uma adolescente sai de sua casa para ir trabalhar em outra residência, é simplesmente trabalho que acontece ali, ainda que existam discursos de oportunidades e mobilidade social. Entretanto, hoje, com os resgates de mulheres envolvidas no trabalho doméstico em situação análoga à escravidão, observa-se que, muitas delas, foram trabalhadoras infantis domésticas que, por sua vez, trabalharam nas chamadas “casas de família”. Isso precisa ser modificado urgentemente e essa campanha visa justamente chamar a atenção dessa triste e violadora realidade: que crianças e adolescentes que trabalham em serviços de limpeza ou de cuidado a crianças menores e a idosos, em suas próprias residências ou na de terceiros, são trabalhadoras infantis domésticas e trata-se de uma das piores formas de trabalho infantil existentes na atualidade”, finaliza Katerina
Piores formas de Trabalho infantil
O trabalho doméstico é proibido para pessoas com menos de 18 anos, e é considerado uma das piores formas de trabalho infantil, de acordo com a Lista TIP, instituída pelo Decreto nº 6.481/2008. A prática viola os direitos humanos das crianças e adolescentes à educação, à saúde, à convivência familiar e comunitária, além de acarretar prejuízos ao seu pleno desenvolvimento físico, psicológico e moral, consistindo em porta aberta para outras formas de violação, inclusive a sexual.
Ajude a transformar essa realidade!
Denuncie o trabalho infantil doméstico. Disque 100 ou acesse mpt.mp.br e ipetrabalhoinfantil.trabalho.gov.br.
Não existe final feliz com o trabalho infantil doméstico.
Uma campanha do MPT, OIT, TST e MTE. Apoio FNPETI.