Anúncios nas redes sociais afirmam que a fosfoetanolamina ajudaria a eliminar a doença; estudos científicos, porém, negam eficácia.
Por Bob Furuya, editado por Bruno Capozzi
Apesar dos aspectos positivos, as redes sociais carregam também diversos pontos negativos – ainda mais quando as pessoas simplesmente acreditam em tudo que está lá. Informações falsas aparecem sistematicamente nestes locais e, de tanto que são repetidas, passam a ser vistas como verdade por alguns.
A fake news da vez diz respeito a uma pílula que supostamente curaria o câncer. Trata-se da fosfoetanolamina, uma substância que já passou por testes científicos antigamente, mas não foi aprovada. Mesmo assim, alguns sites e perfis no Instagram estão anunciando o composto químico como “a esperança para o combate ao câncer”.
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Diante disso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) resolveu se manifestar e divulgou uma nota chamando essas propagandas de “irregulares e enganosas”. De acordo com a entidade, a fosfoetanolamina não combate o câncer “ou qualquer doença”, nem possui “propriedades funcionais ou de saúde”.
A Anvisa acrescenta que a substância não possui autorização ou registro para uso como suplemento alimentar ou medicamento no Brasil.
“Utilizar produtos não registrados pela Anvisa para o tratamento do câncer é extremamente arriscado. Esses produtos podem interferir negativamente nos tratamentos convencionais, além de apresentar riscos de contaminação”, conclui a nota da agência.
Não é a primeira vez que essa substância aparece
- Há quase 10 anos, em 2016, a então presidente Dilma Rousseff sancionou uma lei que liberava a tal “pílula do câncer”.
- Havia uma pressão popular grande, à época, pela aprovação – e não tinha como ser diferente: o câncer é uma das doenças mais cruéis que existem, e sem cura.
- O Congresso aprovou rapidamente o projeto, que tinha entre os seus autores o então deputado Jair Bolsonaro.
- Só que um mês apenas depois da publicação da lei pela presidente, o Supremo Tribunal Federal concedeu uma liminar suspendendo a distribuição das pílulas.
- O julgamento de fato, do mérito, ocorreu em 2020, confirmando a inconstitucionalidade do dispositivo.
- O STF entendeu que os parlamentares não podem liberar substâncias químicas que não tenham sido avaliadas e autorizadas pela Anvisa.
- Como eu disse, tudo foi feito meio às pressas, na esperança de que o negócio poderia mesmo ser eficaz.
- Só que os testes clínicos apontaram o contrário.
- O Ministério da Ciência e Tecnologia criou um grupo de trabalho sobre o tema e o parecer foi negativo.
- Em 2017, o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) promoveu uma pesquisa para avaliar os efeitos da substância e o resultado foi o mesmo.
- De 72 pacientes que tomaram a pílula, apenas 1 teve melhora no quadro – mas não ficou provado que essa melhora teve a ver com a substância.
Um pouco mais de história
Ok, deu para entender que as entidades de saúde, científicas e a própria Anvisa não aprovaram a pílula lá atrás. E você deve estar se perguntando o seguinte agora: mas como ela está sendo comercializada mesmo assim? A ponto de existirem esses anúncios nas redes sociais.
Essa é a grande questão. E foi o pulo do gato do fabricante, à época. Sem autorização da Agência e do STF, a empresa, que tem sede nos Estados Unidos, passou a vender a substância como suplemento alimentar – e não como remédio.
Pela lei, suplementos alimentares não precisam de registro na Anvisa, a não ser aqueles que possuem enzimas ou probióticos. Ou seja, encontraram a brecha perfeita e a substância continuou circulando por aí.
Só que a repercussão negativa à época fez com que a “pílula do câncer” fosse deixada de lado. Só que as pessoas costumam ter memória curta, e o assunto voltou com força agora, impulsionado pelas redes sociais.
Daí essa nova manifestação da Anvisa. Daí também a importância do Jornalismo: fazer com que as pessoas se lembrem.
As informações são da Agência Brasil.