Início Opinião Os Três Poderes e o  zelo de suas prerrogativas

Os Três Poderes e o  zelo de suas prerrogativas

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      A instalação da CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) sobre os desvios no INSS é um momento importante no Congresso Nacional. Trata-se de uma investigação a cargo das duas casas legislativas e sua composição é eclética. Não tem a nociva marca da maioria de governistas – que poderia torná-la imprestável – e nem oposicionista, que também a desviaria do objetivo principal de apurar devidamente as irregularidades, identificar os culpados e apresentá-los aos instrumentos e órgãos sancionadores. A comunidade – especialmente os aposentados e pensionistas que tiveram descontos fraudulentos nos seus proventos – espera que seu dinheiro seja devolvido e os que agiram irregular ou criminosamente tenham a justa reprimenda. Nada mais que isso.

      Senado e Câmara dos Deputados têm outras  pendências que deveriam se apressar para resolver porque delas depende a paz e a regularidade da atividade político-administrativa. A mais urgente é a proposta de anistia aos implicados nos acontecimentos de 8 de janeiro de 2023. Em vez de tentarem implicar o ex-presidente Jair Bolsonaro num processo que sofre severos questionamentos, o melhor seria anistiar os envolvidos e adverti-los de que se voltarem a agir naquela direção poderão ter problemas. Mais importante do que condenar o ex-presidente e seu estafe é descondenar os velhinhos, velhinhas e outros manifestantes cujo pecado não passou  de gritar na porta dos quartéis pedindo a intervenção militar, e não vingou, até porque os militares não tinham disposição para o golpe e as possíveis lideranças não estavam presentes.

      Outra pendência de alta responsabilidade é a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da Segurança Pública. Proposta pelo governo federal, que ainda encontra dificuldades junto aos governadores. Os parlamentares são os seres talhados para negociar as diferenças e fazer com que os benefícios decorrentes da proposta sejam transformados em lei e a população possa deles se beneficiar. O grande impasse dos governadores é a desconfiança de que o governo do presidente Lula quer assumir o controle da Segurança e eliminar ou enfraquecer o Poder de Polícia, hoje pertencente aos Estados. Parece não estar difícil conseguir que a União dê sua contribuição para a melhora dos serviços hoje executados pelas polícias estaduais sem querer diminuir a autoridade dos governadores e de seus propostos das polícias civil e militar. Se conseguir manter bancos de dados criminais eficientes e a fluidez do acesso dos Estados ao seu conteúdo, o governo federal já terá feito muito e a população certamente ficará satisfeita.

      O clima criado no Senado e Câmara em respostas à criação e instalação da CPMI do INSS poderá ser o modelo para a redenção do meio parlamentar, que ultimamente tem sido maltratado pelos dois outros Poderes (Executivo e Judiciário). Senadores e deputados irão muito bem se, a exemplo do agendado na investigação do INSS, fizerem  valer a posição e as prerrogativas do Legislativo.

      Não devem demorar, também, para discutir e votar a eliminação do foro privilegiado que, em vez de fortalecer o parlamentar, o coloca sob o jugo do Judiciário e sujeito aos humores de  seus integrantes. Deputado e senador é um cidadão diferenciado em sua comunidade; não deve ficar exposto à primeira instância para evitar possíveis perseguições pessoais, mas também não devem estar na última, onde não tem mais chance de recurso. Quando envolvidos em preocesso, este deve começar na segunda instância, como já ocorre com os prefeitos. O parlamentar isoladamente é fraco, mas formado em grupos, pode fazer a grande diferença para a discussão, encaminhamento e solução dos problemas da comunidade e do País. Mas precisam, todos eles, ter coragem.

      Finalmente, o outro grande impasse que fragiliza o Poder Legislativo é a atitude dos dos presidentes – do Senado e da Câmara – quanto aos pedidos de impeachment. Precisa o colegiado legislativo lembrar que a legislação – a Constituição e a lei específica que regula os afastamentos de autoridades enredadas – tem toda a regulamentação e o rito para processamento das propostas. O presidente da casa legislativa correspondente (Senado para ministros do STF e Câmara para o presidente da República) deveriam apenas pautar a discussão e votação dos requerimentos sem demora e deixar que o plenário decida soberanamente se penaliza ou não o envolvido. Além de cumprir a lei, esse procedimento ofereceria ao acusado a oportunidade de se defender, provar inocência e, em tendo razão, sair do processo sem dever nada a ninguém. Lá nos anos 50, Getúlio Vargas venceu a votação do impeachment que a oposição queria aplicar ao seu mandato, livrando-se do problema.  Já Fernando Collor (1992) e Dilma Rousseff (2016), não conseguiram. Mas todos os outros governantes, ministros e outras altas autoridades da República das últimas décadas terminaram seus mandatos com a biografia manchada por pedidos de afastamento não resolvidos no Congresso Nacional. Um grande desperdício de ordem político-institucional e fator de enfraquecimento do Poder Legislativo.

 A política brasileira só encontrará paz no dia em que os Poderes da República exercerem efetivamente suas prerrogativas e não abrirem brechas para que os demais avancem sobre seus direitos e obrigações.  O Legislativo que faça as leis e fiscalize; o Executivo governe; e o Judiciário guarde a Constituição e zele do cumprimento das leis. Sem promiscuidades nem concessões…

Por Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)