Médicos de saúde pública, de famÃlia e oncologistas criticam os novos critérios para atribuição da pensão de invalidez, com uns a considerarem-nos inaplicáveis e cruéis e outros a afirmarem que são desnecessários e feitos por quem desconhece a realidade.
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         Em causa está o decreto-lei 246/2015, que altera o regime especial de proteção na invalidez, que estabelece que a partir de 01 de janeiro, quando entra em vigor a lei, esta pensão será atribuÃda aos doentes que “clinicamente se preveja evoluir para uma situação de dependência ou morte num perÃodo de três anos”.É este ponto que tem gerado várias crÃticas dos médicos, mas também de associações de doentes, dos reformados e até da Federação Nacional da Educação, com alguns a exigirem a revogação da lei.Contactado pela Lusa, o Instituto da Segurança Social esclareceu que as alterações pretendem tornar “a lei mais justa, abrangente e equilibrada, sem qualquer perda de direitos”, sublinhando que “o horizonte temporal de três anos remete para o próprio conceito de invalidez permanente” já consagrado na lei.
                Observa ainda que estas alterações resultam da avaliação de uma comissão especializada – composta por representantes de vários organismos com intervenção nestas matérias, por quatro médicos – que consultou a Ordem dos Médicos e outras entidades com competência sobre a matéria.Contudo, para o presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública, a “lei é completamente inaplicável” e de uma “extraordinária crueldade para as pessoas que estão em sofrimento”.
            “O que vai gerar é grande confusão, grande perturbação, um adiamento de todas as situações e há muitos doentes que vão sofrer com isso”, disse Mário Jorge Santos à agência Lusa.O médico entende esta situação como “incompetência pura” e não como uma vontade de querer reduzir custos, considerando que a intenção do legislador era correta, ao terminar com a lista de doenças que conferem invalidez, mas sublinhando que “o processo escolhido é inacreditável”.
            O presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, Rui Nogueira, também destaca como ponto positivo o facto de a lei passar a abranger todas as doenças, mas considera desnecessário “e terrÃvel” referir a morte.“É chocante, eu julgo que nenhum médico vai dizer que é previsÃvel que um doente vai morrer no prazo de três anos” e, por outro lado, “é desnecessário”, porque não é disso que depende um processo de invalidez.
          “A invalidez é que está em causa, não é a dependência ou morte”, uma pessoa pode não estar dependente, mas estar inválida para o trabalho.Rui Nogueira sublinhou que este assunto é “muito difÃcil e sensÃvel” para os médicos e para os doentes, mas também para o legislador, que “por vezes não tem conhecimento da realidade”.Para o oncologista e secretário-geral da Liga Portuguesa Contra o Cancro, Carlos Oliveira, a lei foi feita por pessoas que nunca contactaram com um doente com cancro e desconhecem a sua realidade.
           “Nos doentes oncológicos a avaliação não pode ser feita com estes limites temporais e com esta obrigatoriedade de uma incapacidade total e da possibilidade de se prever a morte num tempo relativamente curto”, afirmou Carlos Oliveira, que falava à lusa enquanto oncologista.Na sua opinião, os novos critérios “pecam grandemente” pela avaliação que se pretende fazer, que “não corresponde à realidade”, e visam “cortar nas pensões de invalidez”.Manifestou ainda dúvidas sobre se algum médico vai atestar esta situação e questiona mesmo se, do ponto de vista ético, o médico pode fazer algo nesse sentido.
                  “Sob o ponto de vista cientÃfico muito menos, sobretudo na área do cancro”, acrescentou.A nova Tabela Nacional de Funcionalidades que será utilizada como suporte das decisões das juntas médicas é outro alvo de crÃticas do médico de saúde pública.Esta tabela “não mede a incapacidade do doente, mas mede precisamente o oposto, o que o doente consegue fazer”, criticou Mário Jorge Santos, observando que os médicos não têm a formação necessária sobre esta matéria.Jornal i