Imagemilustrativa/reprodução redesocial
Por Alexandre Pegoraro (*)
Se é verdade que uma imagem vale mais do que mil palavras, também é fato que muitas vezes aquilo que é visto não condiz com o que é dito. Trazendo essa reflexão para os acontecimentos abomináveis ocorridos em Brasília no dia oito de janeiro, chega a causar estranhamento observar senhores e senhoras idosas algemados enquanto a palavra ‘terrorista’ é usada a todo momento para se referir a eles por terem participado de tais atos.
Afinal, quando se fala em terrorista, se remete automaticamente a outro tipo de homens e mulheres. São geralmente jovens treinados, ostentando uniformes militares e músculos preparados para praticar atentados em condições difíceis.
Mas, independentemente dos estereótipos, o fato é que a regra é clara. Ou seja: se participaram de atividades que podem ser enquadradas como terroristas, muito provavelmente terão seus nomes registrados como se isso fossem.
E é aí que reside um grande problema. Há quem defenda a tese de que o maior patrimônio de uma pessoa é ter o nome limpo. Neste caso, embora aparentemente muitos deles nunca tenham praticado outros crimes antes, desta vez seus nomes muito provavelmente passarão a ter uma ligação totalmente constrangedora com o termo terrorista.
Passado todo o calor do momento, quando a poeira baixar, é de se supor que muitos deles desejarão recorrer aos trâmites legais para se livrar desta marca. Este movimento trará para a discussão um dos grandes temas em termos de privacidade de dados que é o direito ao esquecimento.
Afinal, até que ponto uma pessoa tem ou não o direito de pedir que uma informação a respeito de si mesma seja removida dos registros históricos, da imprensa, dos motores de busca (como o Google, por exemplo) ou até mesmo de documentos?
O assunto foi muito debatido recentemente na Europa quando um grupo de investimentos pediu ao Google para eliminar dos seus resultados alguns artigos e fotos que apresentam críticas ao modelo de investimento da companhia. A negativa do Google em acatar tal pedido levou o caso à justiça que, por sua vez, utilizou a GDPR (General Data Protection Regulation), que equivale à LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) brasileira, para explicar que o direito à proteção dos dados pessoais não é um direito absoluto, mas deve ser tido em conta em relação à sua função na sociedade e ser equilibrado com outros direitos fundamentais.
Desta forma, tal legislação estabelece que o direito ao apagamento dos dados fica excluído quando o tratamento seja necessário ao exercício do direito relativo, nomeadamente, à liberdade de informação.
Neste sentido, a LGPD observa de forma explícita que a ação de deletar os dados não pode ocorrer quando:
- os dados são cruciais para exercer um direito de liberdade de expressão e informação;
- as informações servirem para cumprir uma obrigação perante a lei;
- se forem necessários para colocar em prática a Autoridade Pública ou possua serventia de Interesse Público;
- para investigações científicas, históricas ou conclusões de estatísticas.
Sendo assim, por maior estranheza que possa causar, uma vez que sejam ‘fichados’ como ‘terroristas’ ou qualquer outro adjetivo parecido com este, os vovôs e vovós que se achavam apenas patriotas terão que lidar com este apêndice desagradável aos seus nomes por muito tempo se é que algum dia conseguirão se livrar deles.
(*) Alexandre Pegoraro é CEO do Kronoos