

O produtor de soja olha para o céu e tem uma certeza: não é possível ter certezas sobre o clima. O volume, a distribuição e a regularidade da chuva são insumos que não se pode comprar, arrendar ou travar preço. Assim, segue como a máxima incógnita de uma lavoura. O mesmo vale para a incidência do sol.
Nos últimos dois ciclos, Paraná e Rio Grande do Sul se revezaram com o pior resultado em produção. Quebras de safra têm sido comuns por lá e o sojicultor sabe bem o culpado: o La Niña.
Contudo, na temporada 2023/24, as probabilidades indicam que outro fenômeno dará as caras, o El Niño. De acordo com a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA, na sigla em inglês), há 89% de chances dele se concretizar.
Por enquanto, segundo o meteorologista do Canal Rural, Arthur Müller, o momento é de neutralidade. “No entanto, as projeções indicam que a partir de agosto já devemos ter a certeza da configuração do fenômeno, que se dá a partir do aquecimento anômalo das águas do Oceano Pacífico”.
Clima nos próximos meses

A tendência para junho, julho e agosto é de mais chuva no Sul e temperaturas mais altas no Centro-Oeste, conforme o meteorologista.
“Para o Sul, a preocupação maior é quanto à intensidade do El Niño. Não adianta chover muito e não ter períodos de sol, já que a planta precisa fazer fotossíntese. Mesmo assim, é provável que o Sul tenha melhores produtividades de soja”.
Quanto à temperatura, Müller destaca que a cultura se beneficia quando os dias se mantém entre 20°C e 35°C. “Para o Nordeste, a tendência para os próximos três meses é de chuva abaixo da média, mas entre setembro e outubro, quando a semeadura se inicia, é provável que o regime de chuvas fique dentro da média”.
El Niño: dos males, o menor
Já o pesquisador da Embrapa Soja, José Renato Bouça Farias enfatiza que, independente de confirmação ou não de El Niño, a notícia positiva é que o La Niña perdeu força e não está mais ativo.
“Mesmo assim, não é possível estabelecer uma correlação perfeita entre produtividade de soja e a existência desses dois fenômenos. O clima tem uma variabilidade natural”, diz.
Todavia, o pesquisador admite que o El Niño traz maior probabilidade de chuva no verão, o que pode favorecer a cultura da soja.
“Por outro lado, maior quantidade de chuva não quer dizer melhor distribuição, que acaba sendo o fator mais importante. A soja é uma cultura muito sensível, de ciclo curtíssimo, com fases fenológicas muito bem definidas. Ausência de chuva e altíssima temperatura em período crítico a destrói”.
Onde pode chover mais?
El Niño costuma trazer mais impactos às cidades, diz pesquisador. Foto: Fernando Stankuns/Flickr
Há maiores possibilidades de o volume de chuva ser mais intenso no Sul do que no Norte do país, de acordo com o pesquisador da Embrapa Soja.
“Já a região Centro-Oeste costuma ficar em uma faixa de transição, onde por vezes tem maior volume e às vezes menos. No entanto, essa região já costuma ter bom regime de chuva naturalmente, independente do fenômeno”, cita.
Müller concorda: “As projeções de agora mostram que no verão, entre dezembro, janeiro e fevereiro, o clima tende a ficar mais seco na região”.
Fazer bem feito para não sofrer com o El Niño
Foto: Embrapa Soja
Farias destaca que a variabilidade do clima é imperativa, independentemente do fenômeno climático. “É normal em anos de La Niña termos altíssimas produtividades e em anos de El Niño termos baixíssimas produtividades. Assim, cabe ao produtor usar sempre as melhores tecnologias possíveis, boas práticas para fazer render a sua lavoura”, considera.
Nesse pacote tecnológico à disposição do produtor de soja, o pesquisador salienta a importância de:
- Procurar cultivares adaptadas a sua região, resistentes às adversidades mais comuns do clima
- Fazer bom manejo do solo, procurando estruturá-lo ao longo dos anos, ofertando a ele maior capacidade de armazenamento de água para suprir as necessidades quando não chover
- Manter o escalonamento de semeadura
O pesquisador afirma que, como a sensibilidade da cultura é muito específica em determinados períodos, não é aconselhável plantar toda a área em uma mesma época e nem usar uma mesma cultivar com mesmo ciclo na mesma propriedade.
“Quando a seca afeta a cultura, ela atinge uma região inteira e, muitas vezes, é comum ver que os produtores dessa região semearam todos na mesma época e com a mesma genética. Assim, quando falta água, todos são afetados ao mesmo tempo. Por isso destaco: é importante semear e usar variedades diferentes das do seu vizinho”.







