
Por Paulo César Régis de Souza (*)
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           Há uma natural suspeição sobre os fatores que levaram os ex-ministros da Fazenda Guido Mantega e Nelson Barbosa, em 2011/2012, a defenderem com unhas e dentes, corações e mentes, a desoneração da contribuição da previdência, passando inopinadamente, da contribuição sobre a folha, de 22%, há 97 anos em vigência na Previdência Social brasileira, para uma contribuição sobre o faturamento, com alÃquotas diferenciadas.  Venderam a ideia ao paÃs, proclamado que favoreceria a criação de emprego e renda e argumentaram que haveria compensação, isto é, que a Receita Previdenciária não seria prejudicada. Não houve mais emprego e renda e a previdência foi para o déficit.
         O desastre acabou sendo proclamado aos quatro ventos pelo ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy e pelo atual ministro, Henrique Meirelles,    Não se sabe o que rolou por cima e por baixo da decisão, mas escrevem as folhas que muita moeda circulou na Fazenda, para fins não republicanos. Os empresários que sonham acordado com a possibilidade de vigorar no Brasil o que vigorou no Chile – Previdência sem contribuição patronal, só dos trabalhadores -, vibraram com a desoneração que ampliou o gigantesco rombo na Previdência Social, um queijo suÃço, com muitos furos produzidos pelo Executivo, Legislativo e Judiciário.
          Além de assaltar a Previdência Social com a renúncia contributiva da cota patronal, com a chamada “pilantropiaâ€, que contempla hospitais, universidades, exportação do agronegócio, Simples Nacional e Microempreendedor Individual, 50 setores da indústria e de serviços receberam de mão beijada a desoneração… E quando a esmola é grande, cego desconfia.
         Uma multidão de cegos no Congresso e no Judiciário vibram quando veem e ouvem lobistas, colunistas, blogueiros e até jornalistas amestrados proclamar aos céus que a previdência é a causa do custo Brasil e que isto impacta o pÃfio PIB, a Ãnfima taxa de crescimento, os elevados Ãndices de desemprego e renda tÃpicos da Ãfrica saariana.
       O empresário brasileiro não gosta de pagar a Previdência. Paga, bufando. Como é uma despesa de fonte, paga, daà porque a maior parte da receita cai no cofre da Previdência, sem que a Receita Federal perceba.Quando se trata de despesa declaratória, o empresariado contrata os mais caros escritórios de advocacia e de contabilidade, para não pagar, alimentando a dÃvida administrativa da Receita Federal e a dÃvida ativa da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. A Receita Federal é precária na gestão de receita declaratória.
Em documento do Ministro Meirelles está explÃcito:
“Levantamento efetuado pela RFB em 31/03/2017 demonstra que somente no âmbito da RFB o total dos créditos ativos (devedores, parcelados e com exigibilidade suspensa por litÃgios administrativo ou judicial) ultrapassa o montante de R$ 1,67 trilhão. Desses, 63,4%, equivalentes a R$ 1,06 trilhão, estão com sua exigibilidade suspensa em decorrência de processo administrativo e 15,8%, equivalentes a R$ 264,12 bilhões, estão com exigibilidade suspensa em decorrência de processo judicial, ou seja, R$ 1,33 trilhão estão suspensos por litÃgio administrativo ou judicial. No âmbito da PGFN, para a mesma data, havia cerca de R$ 1,8 trilhão de débitos inscritos em DÃvida Ativa da União. Desse montante, R$ 1,4 trilhão eram exigÃveis, enquanto que R$ 400 bilhões estavam parcelados, garantidos ou suspensos por decisão judicialâ€.
O Brasil tem a pior performance entre os membros do G-300 na cobrança de devedores. Se há clareza na dÃvida ativa, na dÃvida administrativa, da RFB, a transparência é zero.
O ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, iniciou o processo de desconstrução da desoneração. Levou porrada do empresariado, o ministro Meirelles acelerou. Mas vem de se barrado pelo Congresso, em má hora – por causa da crise polÃtica – que deu o troco: promovendo a reoneração dos que tiveram as alÃquotas reduzidas e com a ampliação da desoneração. Uma situação vexatória, no momento em que os empresários rurais que não contribuÃam para Funrural decidiram não pagar uma dÃvida previdenciária de R$ 20 bilhões e que devedores contumazes, reincidentes e recorrentes, foram beneficiados pelo 18º ou 21º Refis, com redução de juros e mora, alongamento de prazos, para o não pagamento de suas dÃvidas previdenciárias.
Tudo isso, em meio de uma proposta de reforma previdenciária, supostamente para suportar o ônus de uma despesa, 50% dela produzida pela deficitária receita gerada pelos empresários rurais e que implica em um déficit anual de mais de R$ 120 bilhões.
Os que estão lendo já perceberam que o rombo da Previdência é de fácil identificação, renúncia, desoneração, não fiscalização, não cobrança, não recuperação de crédito, Refis e Refis, Desvinculação das Receitas da União (DRU), descasamento rural entre receita e despesa, além de desacertos adicionais nas santas casas, clubes esportivos, universidades, tudo produto de uma cultura em que a previdência é a culpada pelo seu desequilÃbrio financeiro.
A previdência social, de 1923 até 2017, atendeu a mais de seis gerações de brasileiros com pagamentos em dia, tem 60 milhões de contribuintes e 33 milhões de beneficiários, só no Regime Geral de Previdência Social.
É o mais efetivo instrumento de redistribuição de renda no Brasil e da América Latina e é a razão de subsistência de 70% dos 5700 municÃpios brasileiros.
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(*) Paulo César Régis de Souza é vice-presidente da Associação Nacional dos Servidores Públicos, da Previdência e da Seguridade Social – Anasps.






