O número de crimes de feminicídio apresentou uma pequena redução no estado em 2023, mas no contexto da impunidade e da cultura do machismo, aqui a mulher segue sob o domínio do medo constante de morrer assassinada
O ano de 2023 foi marcado por uma série de assassinatos de mulheres em Mato Grosso que deixaram a população indignada e que deveriam envergonhar as instituições de poder. Apesar de uma pequena redução de casos, o estado ainda está entre os campeões de matança de mulheres.
Por mais que se anunciem medidas de vários órgãos, na prática ainda é pouco diante da realidade do estado. Está mais do que na hora de encarar de frente as nossas vergonhas: Mato Grosso tem uma cultura machista de violência e ignorância contra as mulheres, onde matar é o gesto normalizado da ignorância dos homens que expressa esta cultura.
A secretaria de Segurança Pública do Estado divulgou um relatório sobre o quadro de 2023, e apresentou uma avaliação sobre as deficiências a serem superadas dentro da própria instituição policial:
“O relatório realça as regiões que precisam fortalecer as estratégias de prevenção à violência de gênero, aponta deficiências, boas práticas e a responsabilização dos autores nas investigações policiais. É uma análise humanizada dos números, causas e consequências da violência contra as mulheres, com o papel de alertar a instituição sobre a letalidade feminina, bem como para mudança do olhar policial diante das mortes dolosas de mulheres e meninas no estado de Mato Grosso”, apontou o diretor de Inteligência, delegado Juliano Carvalho.
O PROBLEMA DE CULTURA
Na prática, em 2023 tivemos dois episódios emblemáticos que jogaram luz sobre a cultura machista que tem como consequência trágica a matança de mulheres. Primeiro o deputado estadual Gilberto Cattani (PL) gravou vídeos comparando as mulheres com vacas. Mais do que o deboche contra as mulheres de Mato Grosso, o discurso e o vídeo machista do parlamentar, reverberado nas redes sociais, são uma excrescência que alimenta a cultura do machismo. A Assembleia Legislativa passou ao largo da punição exemplar do deputado.
No Poder Judiciário, aconteceu a decisão que favoreceu com prisão domiciliar Carlinhos Bezerra, filho do ex-deputado federal Carlos Bezerra. Apesar das alegações contrárias do Ministério Público, o Poder Judiciário decidiu a favor de conceder o polêmico benefício especial para Carlinhos, um matador de mulher. No estado democrático, a decisão da Justiça, em óbvio, se cumpre, mas também deve ser questionada legitimamente pela sociedade.
Para além de mensagens nas suas redes sociais de sentimentos a cada assassinato de mulher, os políticos devem agir para começar a reverter a cultura do machismo que domina Mato Grosso. A matança envergonha, mas nem de longe se compara à dor dos parentes que perderam suas mães/filhas pelas mãos de um homem assassino. A mudança é lenta, e só pela construção de uma cultura do respeito é que poderemos reverter este quadro bárbaro.
A conferir se 2024 será o ano do começo da mudança cultural, o devido avanço civilizatório. Ou estaremos condenados a repetir a pergunta que não quer calar: até quando?